Rainha dos Céus

Por que usamos roupas?

Quando o homem pecou pela primeira vez, num dado momento a carne começou a nutrir desejos contrários aos do espírito. As paixões se rebelaram contra a razão e o corpo humano perdeu aquela primitiva beleza que o diferenciava radicalmente do corpo dos animais. Inicialmente, o espírito permeava o corpo, por assim dizer, de modo que este deixava transparecer maravilhosamente a alma. O olhar humano penetrava no mais fundo da pessoa, onde resplandecia de modo surpreendente a imagem de Deus, presente tanto no homem como na mulher.

A pureza original do corpo, a sua participação na essência de um espírito límpido, era contemplada com um olhar igualmente puro, livre de qualquer vestígio de concupiscência. Uma vez rompido o vínculo com Deus, o espírito perde, em boa parte, o domínio sobre o corpo, cuja elegância e transparência também se extraviam.

As relações íntimas entre homem e mulher, que em si eram perfeitamente honestas antes do pecado original, transformam-se agora em possível ocasião de ofensa a Deus. Não se pode evitar, na condição atual, o sentimento de verdadeira cumplicidade com desejos sórdidos e vulgares. Então […], vendo que estavam nus, tomaram folhas de figueira, entreteceram-nas e fizeram cinturas para si, recorda o livro do Gênesis (3,7).

Os nossos primeiros pais tiveram de pedir emprestado à natureza o que já não podiam encontrar em si próprios: uma aparência plenamente humana para os seus corpos. A partir desse instante, a roupa torna-se um complemento obrigatório para um corpo que perdeu a sua natural transparência, e que precisa esconder-se quase completamente, desviar de si a atenção, para deixar transparecer a pessoa que contém, (a sua personalidade). Esta é a condição para que o olhar não se perca no corpóreo e possa ainda alcançar aquilo que é especificamente humano, ou seja, os domínios do espírito. Somente deste modo as relações entre as criaturas humanas puderam voltar a ser verdadeiramente pessoais.

Portanto, a função da roupa é precisamente ocultar algumas partes do corpo, adornando-o de tal modo que, mesmo sendo agradável vê-lo, a atenção não se deixe absorver por ele, mas alcance a própria pessoa. De outra forma, as relações entre as pessoas – sobretudo entre o homem e a mulher – descem a um nível inferior (infra-pessoal), que poderia se definir como desumano.

Fonte: O Pudor, edt Quadrante págs 9 a 11.

Vídeos: Padre Paulo Ricardo


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O tema do pudor é, mais do que nunca, um tema urgente. Salvaguarda da intimidade pessoal e fonte do respeito pelo próprio corpo, esta virtude permite ao ser humano – à mulher e ao homem – ser integralmente humano; quando está ausente, degrada-se não somente a sexualidade, mas todo o conjunto de valores em que a pessoa se apóia. E por isso o pudor reveste-se, também para a vida social, da discreta eficácia dos alicerces.

 


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